A Anvisa pode aprovar a qualquer momento uma resolução criada com base nas Medidas Provisórias (MP) nº 983/2020, que dispõe sobre a assinatura eletrônica em comunicações com entes públicos, e nº 2.200-2/2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil). A resolução criaria os requisitos para a emissão, prescrição, aviamento, dispensação e guarda das Receitas de Controle Especial e de medicamentos antimicrobianos emitidas em meio eletrônico.
No texto, que não foi submetido à consulta pública como normalmente acontece com as propostas de RDC da Agência, haveria uma cobrança obrigatória de certificação digital para todos os médicos que receitarem medicamentos prescritos de forma eletrônica, o que já está ocorrendo na prática por conta de outras normativas. Além disso, farmacêuticos também seriam obrigados a possuir certificado digital ICP-Brasil para dispensar o produto na farmácia.
Posicionamento das entidades federais
Em seu site oficial, o Conselho Federal de Farmácia (CFF) afirma defender a proposta, em comunhão com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI).
Josélia Frade, vice-coordenadora do Grupo Interinstitucional de Trabalho sobre Farmácia Digital (GIT-Farmácia Digital) e assessora da presidência do CFF, afirma que o texto da resolução está alinhado ao entendimento do próprio Conselho e do CFM: “Tanto o CFF quanto o CFM têm defendido a obrigatoriedade da utilização da assinatura eletrônica qualificada, ou seja, a assinatura digital com certificado emitido pela ICP-Brasil, única que tem validade jurídica e dá, ao cidadão, a garantia de um sistema auditado e fiscalizado pelo Estado, em todo território nacional”.
Problema da proposta
Para as entidades do varejo farmacêutico, é nesse ponto que está o problema. A Abrafarma, em comunicado oficial, destaca que, embora o Brasil tenha mais de 200 empresas privadas que disponibilizam inúmeras formas de segurança digital, o validador do ITI exige um único formato, que hoje tem baixo acesso e pouca penetração.
Sergio Mena Barreto, CEO da Abrafarma, afirma que, se aprovada, a resolução desvirtuará a intenção da MP nº 983. Para ele, a proposta do governo com a MP foi facilitar e, por isso, abriu a possibilidade do uso de uma assinatura digital avançada, mais simples e segura; e outra qualificada, baseada em certificado digital.
“A Anvisa desconhece todos os avanços tecnológicos dos últimos 20 anos e insiste em um modelo que ficou para trás, optando somente pela assinatura qualificada. Para as farmácias e para o consumidor, será mais burocracia. Ficaremos reféns de um sistema que não cabe mais na era do blockchain. É o Brasil velho, das autarquias e do ‘cartorialismo’, tentando mostrar seus dentes em plena era da liberdade econômica”, critica.
RDC está desalinhada com MPs
ABCFARMA, Febrafar, Sincofarma/SP e Assisfarma uniram-se para enviar à Agência considerações sobre a proposta da RDC. No documento, as entidades afirmam que, ao limitar a emissão de prescrição mediante assinatura eletrônica qualificada (usando como base a MP nº 2.200-2), a proposta de RDC conflita com o que está disposto na Portaria MS/GM nº 467/2020 e na MP nº 983, já que esta última considerou igualmente válidos os documentos subscritos por profissionais de saúde com assinatura avançada ou qualificada.
“A referida Medida Provisória ainda alterou o art. 35 da Lei Federal nº 5.991/73, estabelecendo que as receitas em meio eletrônico serão válidas se contiverem a assinatura eletrônica do profissional (registre-se, não limitando a uma modalidade de assinatura eletrônica) e se atenderem aos requisitos de ato da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária ou do Ministro de Estado da Saúde, conforme as respectivas competências”.
No texto, as quatro entidades afirmam ainda ser imprescindível a participação do setor regulado no processo de elaboração do ato normativo.
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